18 de abril de 2024

Capitais ignoram Ministério da Saúde e mantêm vacinação de adolescentes

0

Ignorando a orientação do Ministério da Saúde de não vacinar adolescentes sem comorbidades contra a Covid-19, 21 capitais e o Distrito Federal decidiram dar continuidade à imunização do grupo. O uso da vacina da Pfizer para pessoas com 12 anos de idade ou mais foi autorizado em junho deste ano pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A inclusão da aplicação para pessoas da faixa etária até 17 anos foi indicada pela pasta para entrar no Plano Nacional de Imunização (PNI) na última quarta-feira. No dia seguinte, contudo, a pasta provocou surpresa ao voltar atrás na recomendação, optando pela suspensão da vacinação sob argumento de adotar cautela.

A faixa etária pode variar conforme o lugar, e a aplicação depende do estoque de doses disponíveis, mas o Correio apurou que Recife, Porto Alegre, Florianópolis, São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória, Belo Horizonte, Palmas, Goiânia, Belém, Boa Vista, Rio Branco, Porto Velho, Manaus, Maceió, Fortaleza, São Luís, Aracaju, Salvador, Campo Grande e DF seguem com a vacinação de adolescentes. Macapá e João Pessoa optaram em seguir a orientação da pasta e interromperam a imunização dos jovens. Teresina, Curitiba e Cuiabá ainda não começaram a vacinar a faixa etária.
Na quinta-feira (16), quando anunciou o recuo na imunização, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou que a pasta “pode rever a posição, desde que haja evidências científicas sólidas em relação à vacinação em adolescentes sem comorbidades”. Por enquanto, ressalvou, “por uma questão de cautela, nós temos eventos adversos a serem investigados. Nós temos essas crianças e adolescentes que tomaram essas vacinas que não estavam recomendadas para eles. Nós temos que acompanhar esses adolescentes”, ressaltou Queiroga, durante coletiva para esclarecer o assunto.
“O Distrito Federal vai manter a vacinação de adolescentes de 14 ,15, 16 e 17 anos com a vacina Pfizer, como estava previsto. A vacina Pfizer é a única que tem registro definitivo, e ela é mundial. Isso é fundamental. E nunca houve nenhuma manifestação da Anvisa quanto a isso”, afirmou o secretário de Saúde do GDF, general Pafiadache. O DF iniciou a vacinação de adolescentes de 17 anos em 24 de setembro. Ontem, o GDF anunciou que na próxima terça-feira (21), iniciaria, também, a vacinação de jovens de 13 anos.
Morte em SP não foi causada pela vacina

A Anvisa se reuniu com a Pfizer para obter mais informações sobre a morte de um adolescente de 16 anos, sete dias após receber a vacina fabricada pelo laboratório americano. O encontro com representantes da Pfizer, na noite de sexta-feira, não apresentou novas informações sobre o ocorrido, mas a Anvisa definiu que vai realizar uma ação de campo nos próximos dias, em conjunto com as autoridades locais de saúde, para obter mais informações sobre o evento.

Apesar do interesse em investigar o caso mais a fundo, a Anvisa manteve o posicionamento de quarta-feira sobre não existirem evidências para suspender a vacinação de adolescentes. “Os achados apontam para a manutenção da relação benefício versus risco para todas as vacinas autorizadas no Brasil, ou seja, os benefícios da vacinação excedem significativamente os seus potenciais riscos”, destacou.

Um estudo feito pelo Centro de Vigilância Epidemiológica de São Paulo concluiu que a morte do jovem não foi causada pela vacina. Segundo o diagnóstico que reuniu 70 pesquisadores, a causa foi a doença autoimune, púrpura trombótica trombocitopênica (PPT), considerada rara e grave. Mesmo assim, o órgão regulador afirmou que “participará de uma ação de campo nos próximos dias, representada por um servidor especializado em ações de farmacovigilância e em conjunto com as autoridades locais de saúde, para obter mais informações sobre a investigação do evento”.
Outra entidade que recomendou a manutenção da vacinação de adolescentes foi o Conselho Nacional de Saúde (CNS). Em nota técnica publicada na noite de sexta-feira, o CNS seguiu a linha adotada no posicionamento da Anvisa na quarta-feira e esclareceu que “não há qualquer comprovação de relação da morte do jovem com a vacina contra a Covid-19” e que “a vacinação é a melhor evidência para reduzir de casos e óbitos decorrentes da Covid-19”.
Segundo o coordenador da Comissão Intersetorial de Vigilância em Saúde, do CNS, Artur Custódio, a medida do Ministério da Saúde diminui a confiabilidade no Programa Nacional de Imunizações. “Não há critérios científicos nessa decisão do Ministério da Saúde. Temos que aumentar a cobertura vacinal. A vacina mostrou a que veio. A desaceleração da pandemia do Brasil mostra o efeito da vacina. É fundamental para a questão das escolas, das pessoas que moram com idosos, que a gente vacine os adolescentes”, concluiu.
Mais de 590 mil mortos por Covid-19

O Brasil contabilizou 935 óbitos por Covid-19 ontem, o maior registro desde o dia 19 de agosto e número três vezes maior do que o registrado na sexta-feira (333). O total de fatalidades registradas em 24 horas foi impactado por dados acumulados da véspera no Rio de Janeiro, que não fechou seu último boletim. Com o acréscimo, o país atingiu 590.508 mortes desde o início da pandemia. A média móvel de fatalidades nos últimos sete dias atingiu 564 — o quinto dia consecutivo em que a média foi superior a 500 perdas. O balanço divulgado pelo Ministério da Saúde também registrou 150.106 casos, o mais alto da pandemia, mas ocorreu devido a um ajuste no sistema que reúne os dados. Ao todo, o país soma 21.230.325 de infectados pela doença.

4,2 mil internados sem comorbidade

Desde o início da pandemia, 7.063 adolescentes foram internados com Covid-19 no Brasil. Destes, 60% eram jovens saudáveis, sem nenhum fator de risco para a doença. O número de óbitos entre pessoas de 12 a 17 anos já ultrapassa os 650 e especialistas ressaltam que os sobreviventes ainda precisam se recuperar das sequelas. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e especialistas recomendam a vacinação de todos os adolescentes entre 12 e 17 anos, mas o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, atendeu a pedido do presidente Jair Bolsonaro e mudou a orientação, não seguida por governadores.

“Na pediatria, os adolescentes são o grupo com maior incidência de comorbidades, então são mais acometidos pela Covid-19”, diz Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações. A médica afirma que as mortes por Covid-19 entre os menores de 18 anos se concentram, principalmente, em adolescentes e bebês com menos de um ano.

Dados do Sistema de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe) do Ministério da Saúde mostram que 4.283 adolescentes sem comorbidades foram internados com Covid-19 em todo o país. Além disso, um em cada três jovens mortos pela doença não tinha nenhum fator de risco, como diabete, obesidade ou síndrome de Down, entre outros.
Jackeline Arruda, de 17 anos, é um exemplo. De Maringá (PR), a jovem praticava esportes e não tinha comorbidade, segundo a família. A morte ocorreu em junho. “Sinto muito por não ter tido antes (a vacina)”, conta a mãe, Lídia Arruda, de 57 anos. “Você fica vendo agora chegar na idade dela e pensa: ‘poxa porque não teve lá atrás. Mas, com certeza, ela teria se vacinado, a esperança da gente era vacinar”.
Ela também critica a postura antivacina de Bolsonaro, que poderia ter se vacinado em abril, mas até agora não buscou a imunização. “Ele está errado em não querer se vacinar. Se a única coisa que a gente pode ter como proteção é a vacina, tem de vacinar todo mundo”, afirma ela, que também relata negacionismo na própria família.
Para além das mortes, Isabella diz que a Covid-19 não acaba depois da alta hospitalar. “Hoje nós temos alas em serviços de pediatria para atender crianças e adolescentes com sequelas pós-Covid”, diz a pediatra. Entre as consequências da doença para os jovens, ela cita problemas pulmonares, neurológicos e psicológicos.
Os dados do Ministério da Saúde apontam que 715 gestantes e puérperas menores de 18 anos foram internadas com Covid-19 no Brasil. Destas, 38 morreram. A nota informativa do órgão que pede a suspensão da vacinação de adolescentes não menciona as grávidas nem as puérperas, que deram à luz há menos de 45 dias As gestantes maiores de 18 anos começaram a ser vacinadas com prioridade em maio.
A maioria das mortes (70%) e das internações (66%) de adolescentes ocorreu entre pessoas de 15 a 17 anos. Entre os mortos, 52% eram pardos, 31% brancos e 4% pretos. Amarelos e indígenas somam 1% cada e outros 11% não declararam raça.
Na sexta-feira, a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia manifestou sua discordância sobre a decisão do ministério. No dia anterior, os conselhos dos secretários estaduais e municipais de Saúde também criticaram a medida e a forma como o governo federal encaminhou a mudança. No Brasil, a única vacina aprovada para adolescentes é a da Pfizer, usada também em países como Estados Unidos, Israel e na Europa.
Reino Unido

Em coletiva na quinta-feira, Queiroga citou mais de uma vez o Reino Unido como exemplo de país que teria desistido de vacinar os adolescentes sem comorbidades. Porém, o site do sistema nacional de saúde britânico (NHS) diz que pessoas de 16 e 17 anos sem fatores de risco podem tomar a vacina. Os jovens saudáveis entre 12 e 15 anos serão vacinados em breve nas escolas, segundo o site do governo, e aqueles com comorbidades estão imunizados.

A vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Isabella Ballalai, diz que é comum observar o que outros países estão fazendo, mas que as conclusões devem ser adequadas para a realidade local. “No Reino Unido, o número de casos de Covid em adolescentes sem comorbidades é muito baixo. Por isso, eles escolheram começar pelos adolescentes com comorbidades”, diz.

A médica fala que o Brasil é um país jovem, com uma parte expressiva da população menor de 18 anos, diferentemente de países europeus, por exemplo. Em razão disso, é importante vaciná-los para controlar a disseminação do coronavírus.
Além das consequências diretas da doença, como internação e óbito, Isabella diz que os adolescentes sofrem muito com a parte social. “Os adolescentes socializam muito e estão se arriscando em meio à pandemia. É muito difícil controlar esse grupo. Eles precisam dessa socialização para que possam se desenvolver”, afirma.

Por: Correio Braziliense

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *