16 de abril de 2024

Estudo identifica mutações relacionadas ao surgimento de tumores

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Foto: YUKI IWAMURA

Um dos maiores estudos genéticos sobre câncer revelou importantes “pistas” sobre as causas dessa enfermidade. No trabalho, cientistas britânicos avaliaram o genoma completo de mais de 12 mil pacientes e identificaram novas mutações relacionadas aos tumores. As assinaturas de DNA também podem indicar se o indivíduo que desenvolveu a doença foi exposto a fatores externos e ambientais que resultam no problema de saúde, como a fumaça de cigarros. Os dados foram apresentados na última edição da revista Science e podem contribuir para o desenvolvimento de novas estratégias de tratamento na área oncológica.
A investigação foi realizada a partir de informações fornecidas pelo Projeto 100 mil Genomas, uma iniciativa de pesquisa clínica inglesa que tem como objetivo mapear o maior número de informações genéticas possíveis relacionadas a tumores e doenças raras. “O sequenciamento do genoma inteiro nos dá uma visão total de todas as mutações que contribuíram para o surgimento do câncer em cada pessoa. Quando enxergamos essas milhares de assinaturas de DNA, conquistamos um poder sem precedentes, conseguindo identificar semelhanças e diferenças entre os pacientes avaliados”, declarou em um comunicado à imprensa Andrea Degasperi, pesquisador associado da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e principal autor do estudo.
O especialista e sua equipe sequenciaram o genoma de 12.222 pacientes que participaram do projeto inglês e também compararam os dados mapeados com resultados de outros dois estudos menores sobre genética e tumores, feito por grupos de pesquisa parceiros. Por meio das análises, os pesquisadores confirmaram algumas mutações conhecidas como as responsáveis por determinados cânceres e também encontraram 58 novas assinaturas mutacionais. “Vimos que cada tipo de tumor pode ter um número limitado de mutações comuns e várias assinaturas mais raras, que ocorrem com baixa frequência na população”, detalharam os especialistas no artigo.
Devido à grande quantidade de dados fornecidos pelo sequenciamento completo, os cientistas também detectaram padrões no DNA que podem indicar se um paciente foi exposto a causas ambientais de câncer, como o contato com a fumaça (cigarros) e a luz ultravioleta, ou se o doente apresenta um mau funcionamento celular. “Esses dados podem ajudar a identificar os culpados pelo câncer”, explicou Serena Nik-Zainal, professora de medicina genômica e bioinformática na Universidade de Cambridge e uma das autoras do artigo.
A equipe de pesquisa destacou ainda que essas informações podem ajudar a determinar o melhor tipo de tratamento para cada paciente. “Algumas assinaturas mutacionais têm implicações clínicas, ou seja, elas podem destacar anormalidades, como um possível ‘calcanhar de Aquiles’ do tumor, e com isso conseguimos direcionar medicamentos específicos”, frisou Nik-Zainal. “Esse estudo mostra como os testes de sequenciamento do genoma inteiro são poderosas fontes de “pistas” moleculares, que indicam como o câncer pode ter se desenvolvido, como ele se comportará e quais opções de tratamento podem funcionar melhor”, acrescentou Michelle Mitchell, executiva-chefe da instituição Cancer Research UK, que apoiou o estudo.
Os cientistas pretendem dar continuidade à análise, em busca de mais detalhes genéticos relacionados aos tumores, mas acreditam que os dados obtidos já podem ser utilizados para auxiliar outros pesquisadores. Os autores do estudo criaram um sistema eletrônico, que orienta cientistas a usarem os dados reunidos no trabalho. “Nós desenvolvemos o FitMS, uma ferramenta computadorizada para ajudar outros especialistas da área genética e médicos a identificar assinaturas mutacionais já conhecidas e novas em pacientes com câncer, para ajudar a gerenciar essa doença de forma mais eficaz”, frisou Nik-Zainal.
“Esperamos usar as pistas mutacionais vistas neste estudo para auxiliar os nossos pacientes da melhor forma possível, com o objetivo final de melhorar o diagnóstico e o tratamento de indivíduos que sofrem com esse problema de saúde” defendeu Matt Brown, diretor científico do grupo de pesquisa Genomics England, que também participou do trabalho.
Defesa cancerígena desvendada
Um estudo norte-americano, também publicado na mais recente edição da revista Science, revelou um dos mecanismos usados pelas células cancerígenas para se proteger dos ataques do sistema de defesa do corpo. Em testes laboratoriais, um grupo de pesquisadores descobriu que esses agentes nocivos ao organismo utilizam um grupo de proteínas para refazer os danos gerados em sua estrutura. Os dados podem auxiliar no aperfeiçoamento de tratamentos, como a imunoterapia.
No artigo, os especialistas explicam que, para matar o tumor, o organismo humano libera a perforina, uma substância que causa lesões na membrana plasmática das células cancerígenas, porém ainda assim muitas delas sobrevivem. Os cientistas não sabiam explicar a causa disso. “Escapar da morte celular é uma das características das células cancerígenas, e como elas sobrevivem ao ataque dos linfócitos T era algo ainda pouco claro para nós”, detalharam os especialistas no trabalho liderado por Alex Ritter, pesquisador do Centro de Pesquisa Genentech, nos Estados Unidos.
Para entender esse processo, o grupo avaliou células vivas em laboratório por meio de imagens de alta resolução. Durante as análises, os investigadores constataram que, após serem afrontadas pelas células de defesa do organismo, as partículas tumorais liberam uma série de proteínas chamadas de ESCRT, que auxiliam no reparo de sua membrana celular, curando pequenas “feridas”. Em testes seguintes, os especialistas desativaram a atividade das proteínas. Eles observaram que a intervenção fez com que os agentes nocivos morressem mais rápido.
Os cientistas admitem que a análise precisa ser aprofundada, mas ressaltam que o estudo pode abrir as portas para tratamentos oncológicos mais eficientes, com ênfase nesse mecanismo. “A inibição dessa ‘maquinaria’ de ESCRT pode aumentar a suscetibilidade do câncer, o que pode proporcionar novas estratégias e opções terapêuticas para a área, mas precisamos que esses dados se confirmem nos desdobramentos de nossa investigação”, ressaltaram os especialistas no artigo científico.
Catálogo utacional
“Ter um genoma tumoral mapeado é algo muito importante para a área clínica pois são essas informações confiáveis que vão nos auxiliar a entender a dinâmica do tumor, o que ajudará a identificar o melhor tratamento. Essas assinaturas genéticas podem indicar a sensibilidade a determinadas drogas, por exemplo, além de auxiliar em um diagnóstico mais confiável. Esse trabalho se baseia em um número grande de novas informações, um catálogo mutacional, que é muito importante para a compreensão de diversos processos biológicos. Ainda assim, essa análise precisa ser aprimorada, já que essas mutações vistas estão relacionadas ao passado dos tumores, e alterações futuras podem surgir com a evolução da doença. Com a continuação dessa pesquisa teremos chances de preencher essas lacunas”
Dávid Szüts, pesquisador do Centro de Pesquisa em Ciências Naturais, na Hungria, em comentário publicado na revista Science

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